Nós estamos acostumados a ler sobre a censura na Ditadura Militar, entretanto, na Era Vargas, 1930 a 1945, pouco se tem conhecimento como isso ocorreu. Aos poucos os historiadores e jornalistas estão trazendo fatos para aumentar nosso arcabouço teórico sobre esse importante período de nossa História recente.
"Perplexas, centenas de pessoas se aglomeraram em frente à Escola de
Aprendizes de Marinheiros, em Salvador, no fim da tarde daquela
sexta-feira - 19 de novembro de 1937 - para assistir a um espetáculo
inusitado. Em frente ao que hoje é a sede do Segundo Distrito Naval, na
Avenida Contorno, uma grande fogueira de livros ardia, grossos rolos de
fumaça escureciam o céu e um forte cheiro de papel queimado se
espalhava pelas imediações da parte baixa do Elevador Lacerda e atingia
até mesmo a parte alta, a Praça Municipal, a Rua Chile e a Praça da Sé.
Não
era um incêndio comum, mas a queima de 1.827 livros considerados
“propagandistas do credo vermelho”, como eram chamados pelos militares
que, nos dias anteriores, tinham percorrido as livrarias da cidade e
apreendido quantos exemplares encontraram. Entre os livros que viraram
cinzas naquela tórrida tarde primaveril em Salvador, 1.694 - mais de 90%
- eram de autoria de um jovem jornalista e escritor baiano: Jorge
Amado.
Os militares baianos cumpriam ordens do interventor
recém-nomeado para a Bahia, o coronel Antônio Fernandes Dantas,
comandante da VI Região Militar. O episódio gerou curiosamente uma ata,
que foi publicada quase um mês depois da fogueira literária pelo jornal
Estado da Bahia, de propriedade dos Diários Associados, do magnata da
imprensa Assis Chateubriand. O documento serve
para demonstrar o quanto havia de intolerância e forte tensão naqueles
anos que antecederam a eclosão da Segunda Guerra Mundial. Sob a lupa da
repressão estavam os ideais do jovem Jorge.
A perseguição às obras de Jorge Amado não era novidade. Desde cedo ele
sentiu a mão pesada da censura. Cacau, lançado em 1933, esteve ameaçado
de não ter a publicação autorizada pelo governo Vargas. Liberado graças a
intervenções de amigos, vendeu em um mês dois mil exemplares, fato que
catapultou o autor para a fama. A sua ficção, tida como subversiva, lhe
rendeu processos, a prisão e, mais tarde, o exílio.
Estava preso
quando da publicação de Mar Morto, em 1936. Novamente detido em 1937,
poucos dias antes da instalação da ditadura do Estado Novo, foi na
prisão que soube da queima de seus livros em praça pública, entre os
quais o recém-lançado Capitães da Areia, que retrata o submundo em que
viviam os hoje chamados meninos de rua.
Exatos nove dias antes da
incineração, o presidente Getúlio Vargas dera um golpe de Estado:
fechou o Congresso Nacional, assembleias legislativas e câmaras
municipais em todo o país. Extinguiu também todos os partidos políticos,
nomeou interventores para substituir os governadores eleitos, instituiu
a censura à imprensa e ordenou a prisão de “elementos comunistas”.
Era
a ditadura do Estado Novo, que outorgou uma nova Constituição, de cunho
marcadamente fascista, e pôs o Brasil em Estado de Guerra, com a
supressão de direitos civis e liberdades democráticas, perseguindo
ferozmente quem professasse a ideologia comunista. Ou apenas
simpatizasse e até mesmo tivesse publicado algo que pudesse ser
entendido como de tendência esquerdista. E foi assim que a literatura de
Jorge virou fogueira em praça pública."(www.correio24horas.com.br)
Nenhum comentário:
Postar um comentário