Algumas pessoas passam pela nossa Existência e deixam marcas para sempre. Caio Augusto é uma dessas pessoas! Eu o conheci no 1º Ano lá no Liceu Cuiabano, mas somente no 3º ano ele foi meu aluno. E me "apaixonei" por seu jeito de eterno menino e de uma inteligência fabulosa. Eu o admirava como pessoa e hoje continuo admirando como HOMEM. Parabéns pelo texto incrivelmente verdadeiro e reflexivo por isso lhe pedi autorização para postá-lo aqui na íntegra.
"E a solidão das pessoas nas capitais” cantou Belchior sem saber que
iria prever um futuro mais próximo do que poderíamos imaginar. A verdade
é que nunca estivemos tão sozinhos. A sociedade do consumo, capitalista
e industrial, conseguiu vender seu ideal de consumo para preencher as
lacunas que se quer existiam dentro de nós, mas que acreditamos, e por
isso, ganharam vida. Temos o incrível poder de acreditar em mentiras e
torna-las desejos insanos de posse.
O princípio de todo este precipício, onde caímos sozinhos, germinou
com o avanço da tecnologia portátil. E a comodidade do mais prático,
substituiu a essência do mais velho. Antes, escrever cartas era uma
espécie de ritual, onde nossos ancestrais sentavam-se diante de sua
escrivaninha à luz de velas e debruçavam seus sentimentos em quase dez
páginas de registro pessoal. E com isso, após o escândalo de sentimento
presente na carta, iam até os correios e, após pagar uma determinada
quantia, enviavam seus sentimentos. Imagine o período de espera, ardendo
em incerteza e ansiando pelas respostas da pessoa distante. Qual
sensação mais bela é chegar em casa e no meio de tantos envelopes de
contas e boletos, uma carta. Uau!
A leitura lenta, os sentimentos sinceros, o riso bobo no canto da
boca, ali, sozinho no quarto. A atitude de apanhar a caneta, encontrar
um belo papel de carta, debruçar sobre a vida e discutir as dúvidas e
responder as certezas da primeira mensagem. E após algumas horas, enviar
a tão esperada resposta. Todo este processo duraria dias e é carregado
de um ritual muito admirado hoje, pela nossa geração prática, fugaz e
preguiçosa.
Bauman discorre sobre a nossa solidão em 44 Cartas de um mundo Líquido
e consegue, com muita decência, nos deixar pensativos. E provocar o
leitor é a maior arma que o autor pode ter: criar um pensamento em outra
mente. Uau!
“Os inventores e vendedores de walkmans, os primeiros aparelhos
portáteis que nos permitiram ‘ouvir o mundo’ onde quer que estivéssemos e
sempre que desejássemos, prometiam aos clientes: ‘Você nunca mais
estará só! ‘ É óbvio que eles sabiam do que estavam falando e por que
essa mensagem publicitária incentivaria a venda de aparelhos – o que de
fato aconteceu, aos milhões. Sabiam que havia milhares de pessoas nas
ruas que se sentiam solitárias e odiavam essa solidão dolorosa e
abominável; pessoas que não só estavam privadas de companhia, mas que
sofriam com essa privação. Em lares cada vez mais vazios durante o dia,
onde o coração e a mesa de jantar da família foram substituídos por
aparelhos de TV presentes em todos os cômodos – ‘cada indivíduo preso em
seu próprio casulo’ –, um número sempre decrescente de pessoas podia
contar com o calor revigorante e alentador da companhia humana; sem
companhia, elas não sabiam como preencher as horas e os dias. ” (Bauman,
2011)
Hoje, é possível entender e encontrar um mundo completamente
apocalíptico. Há em todos nós uma grande abominação as gerações antigas,
ao trabalho desperdiçado para produzir alguma coisa. Time ainda é Money
e isso destrói todo o ritual de criação humana. Valorizamos mais os
resultados do que o processo. E queremos um processo rápido, eficaz e
que não desperdice tempo.
Em sua gênese, o cinema não tinha cor e som. Após alguns anos,
recebemos o presente dos deuses em dar cor e som aos filmes. Conforme a
demanda e o contentamento com tecnologia tão incrível, o cinema rompeu
as paredes e tornou-se cada vez mais tecnológico. Imagem HD, som
digital, cinema 3D, ar-condicionado nas salas, poltronas confortáveis,
cinema 4D com cadeiras que se movem, filmes em que, de acordo com a
cena, é derramado água ou rajadas de ar na plateia... Sempre em frente.
Daqui a alguns anos irão anunciar que inventaram o teatro.
As pessoas estão sozinhas espacialmente, mas conseguem ter um outro
universo criado por elas mesmas na palma da mão. Não abomino a
tecnologia, mas acredito em seu uso moderado. Caminhamos pelas ruas,
completamente sozinhos, e estamos conversando com pessoas em qualquer
lugar do mundo. Há nas redes sociais um universo metafísico onde podemos
“entrar” e viver.
O Facebook é um universo paralelo ao nosso onde podemos compartilhar
nossa vida como nos antigos diários do séculos XIX. Imagine os
historiadores do futuro se debruçando nas páginas vazias da nossa
internet morta analisando os costumes e postagens dos extintos humanos
do século XXI. Nosso deus iria se chamar coca-cola e as hashtags seriam objetos sagrados para anunciar nossos mantras. #TeveBom, #BaladinhaTop, nossas orações sagradas.
É como se hoje eu posicionasse minha mão diante do meu rosto e
falasse com ela e, do outro lado da cidade, outra pessoa fizesse o mesmo
e recebesse a minha mensagem. Não estamos juntos, não estamos próximos,
mas de alguma forma, este instrumento consegue nos unir. NÃO! Ele nos
dá a falsa sensação de união. Ele doutrina nossa mente a pensar no
simplificado, no prático, na conexão mais rápida e no processo mais
curto. Estamos atrofiando pois vivemos mais num mundo que não existe,
mas disseram para nós e agora estamos acreditando!
Falamos sozinhos e acreditamos estar num outro mundo... somos
vítimas da própria Matrix que nos prendemos. Por trás dos inúmeros
sorrisos em selfies, há uma dor solitária que rasga o peito de muita
gente. Vivemos na época em que compartilhar não é sinônimo de partilha e
generosidade e sim circulação de informação e interesse.
“Ser louco é a única forma de ser saudável neste mundo doente”
disse o filósofo Leandro Karnal. E sabe o que é ser louco? Passar horas
escrevendo uma carta de dez páginas e passar cinco dias esperando a
respostas; não postar selfie e sim poesia; revelar fotografias; escrever
um diário; sair com os amigos; desligar o celular; NÃO ter celular...
Oh, meus deuses, em que mundo viemos nos perder?!Caio Augusto Ribeiro"Sou um verbo conjugado na 1ª pessoa do singular. Ator, Diretor, Escritor e pai!"
Eu fico honrado com tamanha doçura das suas palavras, professora! Eu amo você! E obrigado por ser uma das responsáveis por me influenciar e me inspirar!
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