Do fim do século 16 até meados do século 17, o medo da bruxaria se instaurou na Europa, no início da era moderna. Naquela época, disputas de terras, doenças inexplicáveis e suspeitas de mulheres transgressivas ou poderosas figuravam entre as justificativas de acusações de bruxaria. No processo, milhares de pessoas inocentes foram mortas em julgamentos contra o suposto uso de magia negra.
A bruxaria é algo difícil de descrever. A enciclopédia Britannica a categoriza como uma crença religiosa e a define como “o exercício ou invocação de supostos poderes sobrenaturais para controlar pessoas ou circunstâncias, práticas que envolvem feitiçaria ou magia”. Mas a bruxaria abrange uma ampla gama de crenças culturais e regionais, do xamanismo às ideias metafísicas e às tradições folclóricas pré-cristãs que, historicamente, são vistas de forma negativa.
"No mundo todo, há iniciativas para ir além do uso clichê de bruxas montadas em vassouras e reconhecer de forma realista essa história sombria. Na cidade de Salem, Massachusetts, o memorial “Proctor’s Ledge”, onde os acusados foram enforcados em 1692, possui uma paisagem discreta. Em Essex, na Inglaterra, uma pequena placa lista os nomes das 33 vítimas detidas no Castle Park.
Na Escócia, uma placa de pedra nas Ilhas Orkney relembra as 80 pessoas mortas em Gallow Ha’. Ao longo do Caminho Costeiro de Fife, três placas listam as 380 pessoas acusadas de bruxaria. Em 2019, também em Fife, funcionários do governo sugeriram que um farol de 200 anos fosse dedicado à vítima mais famosa do condado, Lilias Adie (que morreu na prisão em 1704 enquanto aguardava julgamento), e a todas as vítimas do período de pânico com relação às bruxas do país. No fim das contas, porém, a campanha não obteve sucesso.
Mas nenhum projeto se equipara à magnitude e ao impacto do Memorial Steilneset, na Noruega. Erguido em 2011, a construção descreve a vida de 77 mulheres e 14 homens executados nos julgamentos de bruxaria de Finnmark, no século 17. Os visitantes encontram o monumento ao fim da Rota Cênica Norueguesa Varanger, à beira do mar de Barents, ao qual as pessoas acusadas de bruxaria eram lançadas. Se boiassem, eram consideradas culpadas.
O arquiteto Peter Zumthor projetou um longo pavilhão que leva à uma estrutura de aço e vidro fumê. Dentro da estrutura, a escultura “The Damned, The Possessed and The Beloved” (Os amaldiçoados, os possuídos e os amados, em tradução livre), da artista Louise Bourgeois (2007-2010), coloca em destaque uma cadeira de aço em chamas cercada por espelhos.
Ao lado de cada uma das 91 janelas da estrutura de aço do pavilhão (uma para cada vítima), um texto impresso em seda — escrito pela historiadora Liv Helene Willumsen, com base nos autos do tribunal — traz o nome das vítimas, as acusações feitas contra elas e seu veredito. Entre as vítimas nomeadas estão Sámi Karen Edisdatter, a primeira das 13 mulheres culpadas por um naufrágio em 1617, e Marette, conhecida somente como “esposa de Torsten”, que foi queimada na fogueira em 1645 e “deixou apenas um par de calças azuis e um suéter velho”.
“Eu estava muito ciente do perigo de romantizar os julgamentos de bruxaria”, alega Willumsen. “Procurei tratar o material histórico de forma respeitosa, sem dramatizá-lo. Quero devolver às vítimas sua dignidade, uma dignidade que elas nunca tiveram em vida. Quero mostrar que eram humanos, [cada um] com um nome e uma voz. Que viviam nos vilarejos de Finnmark.”
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“Não é fácil homenagear uma atrocidade”, escreve a autora vencedora do Prêmio Pulitzer, Stacy Schiff, em seu ensaio First, Kill the Witches. Then, Celebrate Them (Primeiro, mate as bruxas. Depois, homenageie-as, em tradução livre), inspirado na indústria do turismo envolvendo as bruxas de Salem. A respeito do dinheiro injetado na cidade pelo turismo que tem como base seu passado sombrio, ela escreve que “a cidade transformou sua vergonha secreta em sua graça salvadora”.
Apesar de todo seu estilo bruxa kitsch, Salem é um dos poucos lugares que reconheceu sua história de forma apropriada. Nas décadas que se seguiram aos julgamentos das bruxas, os acusadores pediram desculpas oficiais pelos acontecimentos de 1692. Trezentos anos depois, Salem ergueu um memorial às vítimas e, em 2002, Massachusetts exonerou todos os acusados. O turismo também foi modificado; as bruxas atuais agora conduzem passeios que explicam a verdadeira história e desmistificam os estereótipos."
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